O presidente do Brasil defende o trabalho infantil. Por ignorância ou má fé. Ou por ambos. A exploração de mão de obra infantojuvenil é uma clara e cruel violação dos direitos humanos.
Por Davidson Magalhães
Parece também desconhecer os graves perigos da criança exposta ao trabalho; sejam riscos ergonômicos ou psicológicos, traumas que ela pode levar para toda sua vida adulta. Ao proferir a frase, compactua também com o empregador criminoso.
Vamos aos números, presidente?
Em 2016, havia no Brasil 2,4 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos no trabalho (IBGE). Deste total, 1,8 milhão são de famílias com renda de até um salário mínimo. São mais meninos (1,6 milhões) do que meninas (840 mil); mais negros (1,4 milhão) do que brancos (1,1 milhão).
A falta de escolarização amplia e perpetua o círculo da pobreza. Entre 1,9 milhão de adolescentes de 14 a 17 anos que trabalham, 370 mil estão fora da escola e não sabem ler nem escrever. No país onde se explora a mão de obra infantil grassa a pobreza, aumenta a evasão escolar, cresce a baixa escolaridade, expande-se a exploração sexual.
A declaração presidencial, além de ser um palpite infeliz, é um desrespeito à legislação de todo o mundo e à nossa própria Constituição. Bate de frente com os tratados internacionais compactuados pelo Brasil, como a ONU, através da sua Organização Internacional do Trabalho- OIT.
Alguém, por favor, esclareça ao presidente, o que reza a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA: o governo deve assegurar à criança e ao adolescente, os direitos à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Para seu conhecimento, presidente, o Governo da Bahia vai na contramão do que defende. Já retirou do trabalho infantil 351 mil crianças e adolescentes nos últimos 15 anos (IBGE). E ainda temos quase 200 mil crianças exploradas, 24 mil em Salvador. Muito trabalho a fazer. E faremos.
A Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esportes – SETRE participa desse esforço através de um dos eixos de atuação da Agenda Bahia do Trabalho Decente: Erradicação do Trabalho Infantil. Para impulsionar o combate estabelecemos parcerias com municípios, trabalhadores, empregadores e criamos o Fundo de Promoção do Trabalho Decente (Funtrad).
Encaramos a realidade brasileira com trabalho e não com esse seu lero-lero belicoso. As oportunidades desiguais, a má distribuição de renda e a ausência da Educação só aumentam o contingente de famílias mais pobres que acabam empurrando as crianças para o draconiano mercado do trabalho, como se adultas fossem.
Aqui na Bahia, presidente, promovemos a qualificação profissional das famílias e dos adolescentes, além de fomentar a economia solidária como oportunidade financeira de sua sobrevivência.
Temos muitos exemplos. Como as ações preventivas em Salvador, desenvolvidas junto às famílias na Feira de São Joaquim, Ceasa, e baianas de acarajé, em busca da compreensão e incentivos para que cesse o trabalho infantil nestes locais e segmentos da economia informal.
O presidente julga que, por ter sido eleito, tem legitimidade para fazer o que pensa. Não é bem assim. Quem mede o mundo pela régua curta de seus preconceitos e não tem rigorosamente nada de grandioso a oferecer ao país em termos de política, de economia e do bom funcionamento das instituições deve, no mínimo, ficar calado.
O que o povo brasileiro quer, preste atenção presidente, é ver os meninos e meninas do Brasil livres dos lixões, libertos da faina braçal e brutal da roça, do não menos atroz trabalho doméstico, da desalmada sobrevivência nas sinaleiras do asfalto, do submundo das drogas e da famigerada exploração sexual.
E uma rigorosa punição para os exploradores da infância roubada.
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Davidson Magalhães é secretário do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte da Bahia