E alerta que a medida do governo Bolsonaro não proíbe demissões; trabalhadores devem procurar sindicato antes de fechar qualquer acordo.
Nem taxação de grandes fortunas, nem cobrança de impostos sobre os dividendos dos investidores ou especuladores. A única medida implantada até agora pelo governo Jair Bolsonaro diante da crise agravada pela pandemia de coronavírus atingiu em cheio, mais uma vez, os trabalhadores. O Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, criado por Medida Provisória (MP 936), permite às empresas reduzir jornadas e cortar salários por até 90 dias. Para que o trabalhador possa medir o tamanho do prejuízo que pode vir a ter, o Dieese lançou uma calculadora.
A calculadora do Dieese permite simular as reduções permitidas pela MP 936. “A medida prevê um benefício que cobriria parte da perda dos rendimentos durante esse período. Com essa calculadora, as pessoas podem simular o impacto dessas medidas sobre a sua remuneração”, afirma a economista Patricia Pelatieri, diretora técnica adjunta do Dieese. “Todos perderão”, avisa.
A MP 936 autoriza, ainda, a suspensão dos contratos de trabalho por 60 dias. E apesar disso, não garante como contrapartida garantia de que os empregados não sejam demitidos
Empobrecimento e mais crise
A massa salarial do setor privado deve cair entre 9,4% e 27,7%, a depender do nível e do tipo de adesão das empresas ao programa.
A informação consta de estudo elaborado pelo Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica do Instituto de Economia (IE) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Além disso, o empobrecimento dos trabalhadores com carteira assinada deverá reduzir o consumo das famílias e retardar a retomada da atividade econômica ao final do período mais agudo da atual crise sanitária.
As lojas Havan , do empresário Luciano Hang – um dos principais apoiadores de Bolsonaro –, já suspendeu o contrato de trabalho de 11 mil funcionários. Foi uma das primeiras e o corte equivale a metade dos empregados do grupo.
“É um tiro no pé”, define Patrícia. “Mesmo pensando só do ponto de vista econômico, deixando toda a parte humanitária de lado, é um enorme erro o que o governo está fazendo porque está tirando renda da economia”, avisa, fazendo coro ao estudo da Unicamp. “Além das mazelas todas, a possibilidade de uma recuperação pós crise fica muito mais difícil.”
A técnica do Dieese é taxativa: a MP 936 significa perda para os trabalhadores em qualquer uma das opções. “A menos que o trabalhador ganhe salário mínimo. E esses, nós estamos acompanhando e vendo que uma parte significativa está sendo demitida, o que é muito grave, já que a medida não considera estabilidade no emprego”, critica.
A economista considera que a MP 936 joga sobre as costas dos trabalhadores, mais uma vez, a responsabilidade sobre a crise. “Tem várias outras medidas antes dessa penalização que poderiam ser tomadas, inclusive a complementação de 100% do salário do trabalhador, como muitos países estão fazendo e que deveria ser adotada aqui no Brasil .”
Chame o sindicato
“Tudo isso pode ser feito via acordo individual escrito ou negociação coletiva”, informa a economista, que alerta. “A participação dos sindicatos, pela MP, é obrigatória somente nas negociações relativas aos trabalhadores que tenham salários acima de R$ 3.135 (ou três salários mínimos) e abaixo de R$ 12.202,00 (duas vezes o teto do Regime Geral da Previdência Social). Mas os acordos de quem está em outras faixas salariais também podem, e devem, ser realizados por meio de negociação com o sindicato”, ressalta.
“É muito importante que o trabalhador procure seu sindicato antes de fechar qualquer acordo, mesmo sem a obrigatoriedade. Todo acordo individual firmado entre empregador e empregado, deverá ser comunicado ao sindicato da categoria”, reforça Patricia Pelatieri. “Os sindicatos podem ir atrás da empresa e tentar uma negociação coletiva para melhorar as condições acordadas individualmente.”
A economista informa que o Dieese produziu uma Nota Técnica, a 232, com todos os detalhes sobre a MP. “De todo modo, haverá perda de rendimento para os trabalhadores. Então é muito importante que os trabalhadores saibam exatamente o que podem perder com a medida de redução de jornada ou até mesmo de suspensão do contrato de trabalho. A calculadora a ajuda a simular todas essas situações e as possibilidades previstas na MP.”
A calculadora do Dieese funciona de uma forma muito simples, explica Patricia Pelatieri (confira áudio acima). “O trabalhador escolhe a opção redução de jornada e salário ou suspensão de contrato (conforme permite a MP 936). Coloca o valor do salário bruto e clica no botão mostrar.”
Ao clicar no botão vai aparecer mensagem informando se sua faixa salarial depende obrigatoriamente de negociação coletiva ou se pode ser negociação individual.
“Para quem fez a opção por redução de jornada com redução de salário, quando entrar com a informação do salário bruto vão aparecer três possibilidades de redução de jornada com redução de salário: redução de 25%, de 50% e redução de 70%”, detalha. “Daí vai aparecer quanto a empresa deve te pagar em cada uma dessas condições, de quanto vai ser o benefício concedido, quanto o trabalhador terá de perda, em percentual, e qual vai ser a perda real bruta em 30 dias, em 60 dias e em 90 dias para cada uma das possibilidades de redução.”