Devemos deixar sempre claro que consideramos a vida humana como a primeira e mais importante de todas as prioridades. Tudo mais deve girar em torno desta prioridade maior.
Diante da enorme calamidade que assola o Brasil e o mundo neste momento pela expansão do coronavírus, está vindo à tona uma discussão intensa acerca de uma escolha que deveria ser feita pelos governantes e pelo conjunto da sociedade: priorizar a vida humana ou a economia?
Esta me parece uma discussão estéril, sem fundamento, enganadora. Em primeiro lugar, devemos deixar sempre claro que consideramos a vida humana como a primeira e mais importante de todas as prioridades. Tudo mais deve girar em torno desta prioridade maior. Dito isto, vamos analisar o que há de certo ou falso na dicotomia “vida humana x economia”.
A meu ver, a proposição está muito mal formulada. Deveríamos dizer que, na realidade, a escolha a ser feita é a seguinte: “priorizar a vida humana ou o lucro do capital?” E isto se deve ao fato de que, atualmente, em sociedades complexas como a brasileira e as da maioria do restante do mundo, não há como preservar a vida humana sem dar a devida importância à economia.
Então, como entender afirmações do tipo: “É preciso colocar dinheiro nas mãos do povo, isto é que vai resolver o problema”? Devemos esclarecer que, por mais bem intencionados que sejam aqueles que formulam isto, só a primeira parte da proposição é verdadeira. Ou seja, é mesmo importante colocar dinheiro nas mãos das pessoas necessitadas, mas isto, de por si, não vai resolver o grande problema. E é aí que entra a questão da economia.
Para que o dinheiro novo que chega às mãos dos setores mais humildes exerça um papel positivo, muitas medidas econômicas complementares precisam ser tomadas. Sem estas medidas, seria como entregar papel pintado às pessoas. Quem recebe este auxílio emergencial precisa de fato contar com a disponibilidade de produtos de primeira necessidade que possam ser adquiridos com o dinheiro recebido. Ou seja, medidas econômicas precisam ser implementadas para garantir que a produção e a distribuição dos artigos imprescindíveis funcionem de modo adequado. Também será necessário pôr em prática outras medidas econômicas para impedir que setores do grande capital financeiro inviabilizem a execução das tarefas programadas.
Vai ser preciso que muitas indústrias readaptem suas linhas de produção para a fabricação daqueles artigos que são prioritários no consumo popular neste exato momento. Portanto, o governo deve tomar decisões de política econômica muito fortes que obriguem aos bancos e às demais instituições creditícias a facilitar a entrega de recursos àqueles que vão decididamente botar mãos à obra e dar início ao trabalho de produzir o que precisa ser produzido. Não menos importantes são as medidas econômicas que devem gerar condições para que a produção agrícola se concentre nos itens fundamentais da alimentação básica e que, com isto, esta possa até ser ampliada. Em lugar de priorizar créditos para a grande produção agroexportadora, o governo precisa agir para criar condições que permitam que os pequenos e médios agricultores continuem produzindo seus bens alimentícios e colocando-os ao alcance da massa de consumidores populares, sem que com isto fiquem amarrados a juros escorchantes e impagáveis. Em outras palavras, medidas econômicas urgentes de regulação do crédito em bases muito mais favoráveis para os produtores precisam ser tomadas.
Como pudemos apreciar neste breve apanhado, não há nenhuma contradição entre defender a vida humana e cuidar da economia. Muito pelo contrário, para cuidar da vida humana, é indispensável pensar no funcionamento da economia. O que não deveria ser aceito pela maioria da população é que, neste momento de catástrofe, a política econômica siga priorizando o lucro do capital, em detrimento da vida humana, o que é muito diferente.