O preposto das ações trabalhistas deve ser alguém com conhecimentos suficientes para responder aos questionamentos do juiz de forma eficiente na medida em que seu desconhecimento ou despreparo pode levar a empresa a prejuízos financeiros e maus precedentes.

A discussão do tema tem por objetivo alertar sobre possíveis consequências na má escolha do representante da empresa (preposto) sem se atentar ao rigorismo técnico por se tratar de matéria destinada aos leigos.

A reforma trabalhista trouxe a possibilidade de a empresa poder se fazer substituir por pessoa que não seja seu empregado1.

Assim se era um transtorno ter que designar um funcionário para representá-la e “perder” o(s) dia(s) de trabalho na(s) audiência(s), a lei possibilitou a “solução para todos os seus problemas”. #soquenao

É que na Justiça do Trabalho, o que diz ou deixa de dizer o preposto, vincula a empresa; do mesmo modo, seu desconhecimento (o famoso “não sei”) pode importar na confissão (ficta) da empresa.

E por que isso pode impactar negativamente a empresa?

Suponhamos que um ex-funcionário tenha proposto reclamação trabalhista e esteja pleiteando o pagamento de salário “por fora” e horas extras afirmando ainda que a anotação do cartão de ponto – mesmo que biométrico – não condiz com as horas efetivamente trabalhadas.

Indagado, o preposto que responde: “Sim, o Sr. Fulano chamava na sala e pagava em dinheiro” ou “a orientação da empresa era bater o ponto e voltar a trabalhar.. mas só no final do mês quando aumentava a demanda”.

Em tais situações hipotéticas não será necessário ouvir testemunhas porque a confissão do preposto resultará, via de regra, na condenação da empresa.

Mais do que isso, poderá servir de precedente para que outros (ex)funcionários, em situação semelhante, proponham ações já com “um ponto a seu favor”.

Afinal, na era dos processos digitais, é fácil ter acesso ao outros processos e “copiar-se e colar- se” o que foi dito pelo preposto.

Suponha-se ainda que o ex-funcionário alegue que exercia as mesmas funções de seu colega, com igual qualidade e perfeição técnica (equiparação salarial), mas que recebia salário inferior; indagado se havia e quais eram as diferenças nas funções exercidas pelo ex-empregado e seu colega (paradigma), o preposto diz: “Não sei”.

O desconhecimento dele implica em confissão ficta presumindo-se verdadeiras as alegações  da outra parte; admite-se prova em contrário? Sim, mas e se não existirem testemunhas ou outros elementos no processo que contrariem a confissão?

E o que deve ser feito pela empresa para evitar tais situações?

Nos dois primeiros exemplos que tais práticas não existam (podendo o setor de compliance aliado ao jurídico (trabalhista) atuar para inibi-las).

No caso do desconhecimento dos fatos pelo preposto, para evitar a confissão ficta é  necessário que este tenha conhecimento do funcionamento da dinâmica do setor do ex- funcionário, que saiba a diferença das funções do ex-funcionário e de seu colega. Trocando em miúdos que saiba responder ao juiz quaisquer dúvidas relacionadas ao trabalho do ex- funcionário.

Quem eleger como preposto nas reclamações trabalhistas? Pode ser alguém do jurídico, do RH, alguém da própria área ou pode ser um terceiro?

Depende da complexidade do caso, mas devem ser pessoas (empregados ou não) que tenham conhecimento das situações narradas na ação movida pelo ex-empregado, ou seja, uma  pessoa que questionada, saiba responder com segurança ao juiz.

Atente-se, não foi dito que o preposto deve ser empregado da empresa ou necessariamente do setor, mas que detenha conhecimento suficiente para responder as perguntas que lhe forem dirigidas.

A empresa e/ou o advogado devem preparar o preposto?

Não; é necessário que sejam reunidas as informações, com o maior nível de detalhamento possível, para que possa ser transmitidos ao juiz todos os fatos, as provas (inclusive vídeos) e as formas de funcionamento daquilo que está sendo questionado em juízo e das quais o preposto deve ter conhecimento detalhado.

Além disso, quaisquer dúvidas que o representante da empresa tiver, devem ser esclarecidas com o advogado antes da audiência porque quando o preposto é ouvido pelo juiz, o advogado da empresa, via de regra não pode interferir.

Deve existir revisão pelo jurídico interno da empresa?

Isso depende de cada gestor, mas ninguém melhor que a própria empresa para conhecer os detalhes, os programas, os cursos, os certificados que podem auxiliar e enriquecer as peças apresentadas no processo.

Inclusive os resultados do contencioso trabalhista podem servir de parâmetros para identificar possíveis falhas e ajustes a serem feitos na empresa.

Conclusão:

Importante deixar claro que ainda que a defesa seja robusta e o advogado competente, a má escolha do preposto pode implicar em decisões/precedentes desfavoráveis e saídas de caixa. Dessa forma o preposto das ações trabalhistas deve ser alguém com conhecimentos suficientes para responder aos questionamentos do juiz de forma eficiente na medida em que seu desconhecimento ou despreparo pode levar a empresa a prejuízos financeiros e maus precedentes.

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1 Art. 843 – (…)

§ 1º É facultado ao empregador fazer-se substituir pelo gerente, ou qualquer outro preposto que tenha conhecimento do fato, e cujas declarações obrigarão o proponente.

(…)

§ 3º O preposto a que se refere o § 1o deste artigo não precisa ser empregado da parte reclamada (grifamos).

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*Lisandra Mitsuka  é advogada trabalhista sênior com atuação no contencioso e consultivo trabalhista voltado para empresas de cerca de 14 anos dos quais cerca de 6 anos em departamento jurídico e o período restante em escritório de advocacia. Pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.

 

Migalhas, 20 de setembro de 2019