Tem jabuti a caminho. Um grupo de parlamentares quer aproveitar a Medida Provisória 881/2019 para criar um conselho administrativo para julgar processos trabalhistas. Seria uma espécie de Carf, órgão do Ministério da Fazenda, hoje Economia, para julgar causas tributárias administrativamente, mas funcionaria para julgar recursos contra autos de infração lavrados pelos fiscais do Trabalho.

Relatório do deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS) quer aproveitar texto de MP da “liberdade econômica” para criar conselho administrativo de recursos trabalhistas
Roque de Sá/Agência Senado

A proposta está no relatório do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), relator da MP 881 (chamada pelo governo de “MP da liberdade econômica”) na comissão mista do Congresso.

A ideia é criar um conselho composto por membros oriundos de organizações de trabalhadores, empresários e do governo, designados pelo Ministério da Economia — já que hoje o Ministério do Trabalho é uma secretaria dentro da Economia.

O conselho teria estrutura recursal interna, com um conselho superior, mas seria a última instância administrativa. A ideia é desafogar a Justiça do Trabalho. De acordo com o professor Abel Lopes, em 2018 foram lavrados 260 mil autos de infração trabalhistas, muito dos quais foram contestados na Justiça, já que não há esfera administrativa para isso.

Mais cabeças
Abel Lopes defende a ideia do parecer. Hoje, os autos de infração trabalhistas são contestados em órgãos locais nos estados e os recursos vão para o coordenador-Geral de Recursos da Secretaria do Trabalho (CGR). Trata-se de um cargo comissionado, e não de um órgão colegiado.

Segundo Abel Lopes, o Ministério do Trabalho, hoje Secretaria, é o único em que a segunda instância não é colegiada. Isso é incomum até para instâncias administrativas, a exemplo do Carf e do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro (CRSF), o Conselhinho. Um colegiado, diz ele, traria mais segurança para as relações entre o mercado e o Estado.

“A razão maior de criação de um conselho nesses casos seria que a Constituição não distingue entre o litigante ou acusado em processo judicial ou administrativo. Então, por que no caso do processo judicial o recorrente tem direito ao seu recurso ser apreciado por um órgão colegiado e o recorrente em processo administrativo, não?”, explica.

Lopes, no entanto, critica a criação do conselho por medida provisória. O ideal diz, seria que isso fosse discutido num projeto de lei próprio.

Tripartite

Para o professos de Direito do Trabalho e especialista em relações trabalhistas Ricardo Calcini, a criação do chamado “Carf Trabalhista” é muito positiva. “Caso seja aprovado o parecer, esse futuro órgão propiciará que, além de pessoas que já compõem os quadros do então Ministério do Trabalho, novos integrantes da sociedade civil façam parte dos processos decisórios em matéria de fiscalização das relações trabalhistas”, diz.

Para Calcini, só a criação do órgão tripartite (com representantes do governo, dos empregadores e dos trabalhadores) já é um “enorme avanço” na legitimidade das decisões em recursos contra as penalidades impostas pelos órgãos de fiscalização. 

“A mudança do contencioso administrativo trabalhista será paradigmática. Afinal, os recursos administrativos que eram, até então, julgados apenas por auditores fiscais do trabalho, passarão pelo crivo de um órgão de composição colegiada, em que todos os segmentos da sociedade civil (trabalhadores e empregadores) serão representados”, explica.

O efeito disso, diz Calcini, é que a fiscalização seja mais responsável, já que o Judiciário tem sido fonte de insegurança jurídica muitas vezes. “Logo, pacificando-se o entendimento já no âmbito administrativo, toda a fiscalização passará a seguir esta nova orientação que será firmada por estes órgãos tripartites, fazendo com que essas questões ganhem maior transparência e visibilidade pelas empresas, ainda mais quando se está diante de ferramentas como compliance”, afirma. 

Clique aqui para ler a íntegra do parecer da MP 881. 

Conjur, 11 de julho de 2019