Seis medidas já chamam a atenção; a maioria está relacionada a penalidades por infrações trabalhistas
Advogados da área do trabalho afirmam que as mudanças apresentadas na Medida Provisória 905, que criou o programa Emprego Verde Amarelo de estímulo ao emprego, são profundas.
Alteram, por exemplo, regras de pagamento de PLR (Participação de Lucros e Resultados), e estipulam um teto para multas em TACs (termos de ajustamento de conduta).
Pelos menos seis medidas já chamam a atenção. As mais relevantes, segundo a advogada Cassia Pizzotti, sócia do escritório Demarest, são as relacionadas a penalidades por infrações trabalhistas.
No caso das multas administrativas, aplicadas por auditores do trabalho, o texto aumenta os valores, escalonados de acordo com gravidade da infração, porte da empresa e funcionários prejudicados.
“Os valores estavam defasados, mesmo com atualizações na reforma trabalhista. A penalidade era, por exemplo, de R$ 3 mil por empregado sem registro, infração grave. Agora, passa a até R$ 10 mil por trabalhador em caso de faltas gravíssimas”, afirma.
Os montantes se iniciam com uma faixa de R$ 1.000 a R$ 10 mil para infrações leves, a depender do porte da empresa, e chegam a R$ 100 mil no caso das gravíssimas.
As multas em que o cálculo é feito por trabalhador prejudicado começam em R$ 1.000 e vão até R$ 10 mil. As penalidades serão corrigidas anualmente pela inflação.
Outra novidade é que o escalonamento passa a valer como referência para punições aplicadas nos TACs firmados pelo Ministério Público do Trabalho com empresas investigadas. Hoje, não existem limites para os valores.
A norma diz que as penalidades previstas nos TACs devem “ser atreladas aos valores das infrações contidas” na MP. O texto também limita a dois anos a validade dos termos, renováveis por mais dois.
“Isso acaba com os TACs por prazo indeterminado e com multas milionárias. Hoje, o promotor tem liberdade para definir as penas. Com a nova norma, deverá haver uma busca por revisão de muitos TACs”, diz Pizzotti.
“É uma alteração importante. Em tese, as questões em que o Ministério Público atua são graves e envolvem danos coletivos, como o trabalho escravo. A depender do tipo de infração, podem chegar a milhões”, afirma Beatriz Tilkian, sócia do Gaia Silva Gaede.
A MP libera ainda que os valores da PLR sejam definidos por acordo da empresa com uma comissão de empregados sem a participação de sindicatos. Atualmente, a lei exige que haja representante sindical.
“É difícil conseguir a participação sindical nesses grupos, e a aprovação de valores sem o representante do sindicato tem sido questionada pela Receita, que tem caracterizado os pagamentos como salários, sobre os quais incidem encargos”, diz Vivian Casanova, sócia do BMA.
O acordo que estabelece os critérios do pagamento, que hoje precisa ser fechado antes do período ao qual a PLR faz referência, passa a poder ser assinado em até 90 dias antes do depósito.
“A norma prevê também a possibilidade de acordo individual de PLR com empregados que tenham formação superior e ganhem mais que o dobro do teto da Previdência Social [R$ 11.679]”, afirma Cassia Pizzotti.
Fundações e entidades sem fins lucrativos, que antes não poderiam fazer o pagamento de PLR, agora ganham essa possibilidade.
O pagamento do prêmio —uma espécie de bônus por desempenho pago esporadicamente ao trabalhador— também foi reformulado.
A possibilidade do pagamento já existia, mas de acordo com Pizzotti, não era usual porque, até a reforma trabalhista, o prêmio era considerado salário para fins tributários.
“A reforma definiu que não seriam salários, mas os critérios eram genéricos, e a Justiça entendia que não permitiam que a empresa tivesse uma política de prêmios definida, ou que houvesse pagamento todo ano ao empregado.”
Agora, a MP permite que o empregador defina com o empregado ou com um grupo de trabalhadores qual será a política de prêmios e o desempenho esperado.
Também limitou o pagamento a até quatro vezes por ano e uma por trimestre. O trabalho aos domingos, ponto que constava na MP da Liberdade Econômica e foi retirado do texto pelos senadores, volta agora na MP 905.
“Até hoje, era exigido um acordo coletivo específico que permitisse o trabalho aos domingos. Agora, ele passa a ser dispensado. Convenções e acordos coletivos, porém, poderão proibir que determinada categoria trabalhe aos domingos”, afirma Cassia Pizzotti, do Demarest.
“Pelo texto, trabalhadores do setor de serviços precisam ter ao menos uma folga no domingo a cada quatro semanas. Para os da indústria, a regra é uma folga em domingo a cada sete”, diz ela.
Em mais uma medida ressuscitada, o governo liberou o trabalho aos sábados para os bancários. Também estendeu a jornada de seis para oito horas diárias.
A MP alterou o artigo específico da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) que trata da jornada da categoria. O trecho modificado excluiu a expressão “com exceção dos sábados” e também a menção ao trabalho em “dias úteis”.
A presidente da Contraf-CUT (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro), Juvandia Moreira, diz que a categoria já quer discutir as modificações com a Fenaban (Federação Nacional dos Bancos) em reunião marcada para quinta-feira (14).
“Esse tipo de mudança não interessa a ninguém, senão aos bancos. Não tem cabimento aumentar a jornada. É o tipo de medida que não vai aumentar o emprego”, afirma.
Na regra geral de hoje, a jornada de trabalho dos bancários é de seis horas, de segunda à sexta.
A limitação de seis horas está mantida aos caixas.
O advogado Cleber Venditti, do Mattos Filho, explica que a MP inverte o que estava previsto na CLT. “Agora, seis horas de trabalho viram a exceção. É uma mudança significativa com impacto na folha de pagamento e na força de trabalho dos bancos.”
Para a Febraban (Federação Brasileira de Bancos), a medida alinha o setor com “modernas práticas de atendimento ao público, adotadas por outros setores e em países desenvolvidos.”