O “mercado” consultado toda semana pelo Banco Central (BC) prevê agora no fim de junho que a economia crescerá 0,8% este ano. Foi a 17ª vez seguida que a estimativa encolheu. Em janeiro, calculava uma alta de 2,5%. Era essa aposta também logo após a eleição de Jair Bolsonaro.
Agonia, de Edvard Munch (1915): uma metáfora da economia do Brasil
Com aparente espanto, o governo prepara-se para incorporar, em suas contas e análises, esse decepcionante nível de atividade. E, por meio do secretário de Política Econômica, Adolfo Sachsida, ultraliberal feito o chefe Paulo Guedes, admite que a eventual aprovação da reforma da Previdência não será a salvação da lavoura, como alertam alguns economistas há tempos.
Ao cair na real, o governo reconhece até que o setor público tem papel decisivo no estímulo ao Produto Interno Bruto (PIB), conforme o presidente do BC, Roberto Campos Neto, outro liberal da linha de Guedes. Mas Campos Neto faz isso de forma tortuosa e preocupado em não ser cobrado a cortar os juros básicos da economia, a Selic, hoje em 6,5% ao ano.
Sachsida tem sido o porta-voz da confissão de PIB medíocre em 2019. À Folha de 24 de junho, ele disse que o governo mudará a divulgação de suas estimativas de PIB para elas não demorarem muito para serem conhecidas após noticiadas aquelas do “mercado”. “Está caindo tão rápido (a previsão do mercado) que, quando é publicado (o cálculo do governo), estamos destoados”.
Três dias antes, o secretário havia despontado no Estadão a opinar sobre o efeito limitado, no PIB de 2019, de eventual votação de novas regras de aposentadorias. “Com a (reforma da) Previdência passando vai melhorar o PIB? Claro que vai, mas de 1% para 1,6%. Ainda é uma realidade muito ruim”, disse. “Temos de agir para a coisa não ficar pior ainda.”
O que Sachsida faz é aceitar que, pelo bem do PIB, não basta que melhorem as expectativas dos agentes econômicos, algo que poderia ocorrer com a aprovação da reforma. Jogar todas as fichas na “confiança” do “mercado” é um pilar do pensamento econômico liberal. E uma forma de defender a contenção dos gastos públicos.
Apesar de admitir que confiança é pouco, o secretário salienta que o governo não usará gastos e investimentos públicos para empurrar a economia. A ideologia não deixa. “Essa agenda está fora e não será repetida. Não tem aumento de gasto público”, afirmou ao Estadão. “Esse é um governo pró-mercado.” O plano oficial, diz, é tentar direcionar gastos privados para áreas de peso no PIB.
Razões ideológicas também influenciam o presidente do BC em suas análises sobre o momento da economia brasileira. Ao Valor de 5 de junho, Campos Neto disse que “há um tema que a gente tinha olhado no passado e acho que cresceu em importância”, que “é a complementaridade entre o setor público e o setor privado”, que é “bastante alta”.
Segundo ele, o gasto público federal, dos estados e dos municípios ajudava a incentivar “alguma indústria, alguma área produtiva”, sobretudo na construção civil. Houve, porém, disse o banqueiro, uma “parada no motor público muito rápido”, e a compensação dessa parada por parte dos gastos privados “não ocorreu na forma esperada”.
Com essas palavras, Campos Neto admitiu, de forma elíptica, que os liberais erraram ao desprezar o papel do setor público. Na mesma entrevista, ele deixou claro que não adianta cobrar o BC a baixar o juro como medida de incentivo ao PIB. O papel da autoridade monetária, disse, não é pensar no crescimento, mas na inflação.