O empregado que é requisitado pelo empregador através do aplicativo WhatsApp fora da sua jornada de trabalho, no seu intervalo para refeição ou em suas férias para resolver questões relacionadas ao labor, pode configurar tempo à disposição do empregador e, consequentemente, gerar o pagamento de horas extras.
O aplicativo de mensagens WhatsApp se tornou algo praticamente indispensável para maioria da população. Em razão da sua facilidade de comunicação, a troca intensa de mensagens, nos diversos grupos, a qualquer hora, tornou-se prática comum desde para assuntos meramente recreacionais, até em espaços destinados ao ambiente de trabalho.
Em relação ao ambiente de trabalho, certamente o aplicativo WhatsApp se faz cada vez mais presente nas relações empregatícias, fenômeno que tem relevância para o mundo jurídico, pois a sua irrestrita e má utilização pode gerar supressão de direitos e acarretar demandas judiciais. Fato é que o WhatsApp passou a ser utilizado pelas empresas como uma ferramenta de trabalho, e não podemos esquecer que o mundo virtual reproduz o espaço real e, nesse sentido, as atitudes de empregadores e empregados refletem e geram efeitos a partir do diálogo por mensagens.
Logo, o empregado que é requisitado pelo empregador através do aplicativo WhatsApp fora da sua jornada de trabalho, no seu intervalo para refeição ou em suas férias para resolver questões relacionadas ao labor, pode configurar tempo à disposição do empregador e, consequentemente, gerar o pagamento de horas extras ou pagamento de indenização.
Esse foi o entendimento da magistrada Daniela Torres Conceição da 3° Vara do Trabalho de Montes Claros, que condenou uma empresa de transporte rodoviário de passageiros a pagar horas extras a um ajudante de tráfego que era constantemente acionado pela empresa por WhatsApp, tanto durante o intervalo quanto fora do horário normal de trabalho. Ficou comprovado nos autos através do aplicativo, que o funcionário era convocado pelo seu superior hierárquico para trabalhar ou resolver questões ligadas ao labor durante o intervalo e também antes do início, ou após o encerramento da sua jornada.
Para a juíza, o tempo em questão deve ser considerado como de efetiva prestação de serviços, integrando a jornada de trabalho para todos os fins. Ao caso, aplicou o disposto no artigo 4° da CLT, que diz: “Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada”. Nesse contexto, deferiu ao trabalhador o pagamento de horas extras diárias.
Nesta feita, tratar de assuntos relacionados ao labor fora da jornada de trabalho pode vir a ser caracterizadas como hora extra. O que garante este direito é o artigo 6° da CLT, que dispõem: ‘’Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego. Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio’’.
Sem dúvida, a evolução tecnológica influencia cada vez mais nas relações empregatícias, no entanto, é imprescindível que o trabalhador se desconecte (direito de desconexão) do seu labor, de modo a preservar sua integridade física e mental, destacando que o aprimoramento das ferramentas de comunicação devem servir para a melhoria das relações de trabalho e otimização das atividades, jamais para ‘’elastecer’’ uma jornada de trabalho.
Cabe destacarmos a súmula 428 do TST que determina o pagamento do sobreaviso quando houver “violação à desconexão ao trabalho”. Tal verba adicional depende da instrução dada pelo empregador e do contexto em que o trabalho foi prestado. Nas situações em que o acesso ocorre fora do período de trabalho a pedido da empresa, haverá a configuração de trabalho fora do expediente, mesmo que o aparelho de celular pertença ao empregado, uma vez que seu tempo livre é tomado para responder mensagens de origem laboral.
Ainda, a inobservância dos devidos repousos e do desejado convívio familiar ou social, em razão do trabalho prestado pelas vias virtuais, podem impor ao empregado enfermidades psicológicas, como “stress” e depressão, dentre outros. Todas as enfermidades ocupacionais, ainda que não originadas exclusivamente em razão do trabalho (nexo concausal), são equiparadas a acidente de trabalho e podem ensejar a obrigação do empregador de reparação civil quanto aos danos morais e materiais relacionados à doença. Nesse contexto, a conexão excessiva concorre para a privação de uma vida saudável pelo empregado.
Desta forma, o fato de o empregado ter disponibilidade de permanecer conectado em tempo integral no aplicativo WhatsApp, não elide a obrigação do empregador de respeitar todas as normas consignadas na CLT, principalmente a respeito da jornada de trabalho e saúde ocupacional.
Assim, o melhor para ambas as partes da relação de emprego é firmar acordos razoáveis para uso de tais ferramentas, utilizando-as em casos estritamente necessários e, preferencialmente, dentro dos limites horários legais.
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*Willian Jasinski é advogado trabalhista, formado em Direito pela Universidade Norte do Paraná, com especialização em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná.